Design 2022
Bianca Galvão
Product Design Manager na VTEX
Virginiana, Organizadora, Gateira

Design nas organizações: a importância da definição de papéis

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Chega a ser redundante falar sobre o crescimento acelerado em que a nossa profissão se encontra. Já estamos cansados de saber, diante dessa clássica projeção, que finalmente ficou evidente para as grandes corporações o real valor do trabalho de um designer. Nos últimos anos, algumas pesquisas - e o nosso LinkedIn - mostram um grande crescimento na demanda por profissionais de design de produto, na migração de designer gráficos (ou de outras áreas) para UX, no número de cursos de especialização, no aumento de salários e de cargos elevados, entre outros.

N/N Group - Projeção do número de profissionais de UX para os próximos 30 anos.

Mas será que as empresas estão mesmo preparadas para receber esses profissionais e alocá-los em estruturas de times que façam sentido e atendam às expectativas de ambos os lados? Uma coisa é certa, quanto mais a área cresce, mais é preciso refinar o entendimento sobre como recrutar, classificar, nomear, descrever e organizar esses cargos, que vêm se multiplicando e gerando mais e mais ramificações.

É normal que uma evolução veloz como essa seja caótica, o importante é termos consciência disso e abraçarmos a mentalidade de convergir conceitos e definir padrões para que as gerações futuras adequem-se mais confortavelmente ao cenário. Isso é válido não apenas para 2022, é um ponto de atenção contínuo.

POR QUÊ?

Por que é importante que os papéis estejam bem definidos?

Não é à toa que resolvi escrever sobre isso, minha mente já é um tanto guiada a problemas, então é claro que ao longo dos anos notei alguns que me trouxeram a preocupação de externalizar esta mensagem. Ainda há muita confusão sobre o que se espera dos designers, e a mesma dá-se de várias formas: desde dentro do próprio time de design entre possíveis especializações, também entre níveis de experiência, e até mesmo entre áreas distintas. Independente do espectro analisado, a pergunta é sempre a mesma:

Onde termina o trabalho de um e começa o do outro?

Ah, mas tudo bem se isso for orgânico, precisamos mesmo definir? Pela minha perspectiva: sim! Resumindo com um pouco do que já vi por aí, isso é o que acontece quando o limite entre os papéis não é bem claro:

  • Contratações erradas: um escopo de trabalho mal definido frustra tanto a empresa quanto o profissional, que acaba não conseguindo entregar de acordo com o esperado.
  • Expectativas desalinhadas: é sempre mais difícil avaliar o desempenho de um profissional quando ele não tem clareza do que a posição dele exige.
  • Sobrecarga ou subutilização: fazer além do esperado gera exaustão desnecessária, assim como fazer aquém acarreta desmotivação.
  • Sobreposição de função: nunca é confortável sentir que fez o trabalho do outro ou ter aquilo que entende ser seu trabalho executado por terceiros.
  • Baixa confiança e performance: os pontos acima implicam na queda da auto-confiança, e consequentemente as pessoas passam a performar pior.
  • Decisões trocadas ou inexistentes: diante de impasses, se as diferentes áreas não possuírem o seu respectivo responsável, decisões importantes para o produto podem ser negligenciadas.
  • Produto ou tarefa sem dono: a execução de cada etapa do processo precisa ter pessoas específicas acionáveis para que o produto não vire "batata quente".

Se todo mundo é responsável por algo, então ninguém é

Existem vários artigos como este falando sobre formas ideais de lidar com essas atribuições, mas minha intenção aqui não é julgar quais estão certas ou erradas, e sim trazer a reflexão sobre minimamente criar um espaço seguro de atuação para cada cargo. Tudo isso, é claro, sem desestimular o trabalho colaborativo, até porque uma coisa não exclui a outra. Não importa o tamanho da empresa ou o seu modelo organizacional, vertical ou horizontal, o meu ponto é que alguma definição exista.

Para tangibilizar melhor o que quero dizer, vamos observar como funcionam outras profissões. Em um centro cirúrgico, por exemplo, apesar de os profissionais trabalharem em equipe e comunicando-se o tempo todo, cada indivíduo - do médico ao anestesista - tem a sua função, e foca especificamente no seu papel durante a operação de um paciente para que a mesma obtenha sucesso. Já em um restaurante, mesmo que os pratos sejam criados de forma colaborativa, cada cozinheiro fica responsável por uma praça, e precisa executar seu trabalho de forma eficiente para garantir que a cadeia de processos resulte em um cliente satisfeito com a comida.

Quem já jogou Overcooked sabe bem como é isso! Esse jogo de videogame simula justamente uma cozinha com uma série de pedidos, e se os jogadores não se organizarem previamente sobre quem vai fazer o que (picar, cozinhar, lavar a louça, servir, etc.), vai ficando simplesmente impossível passar de fase. Mesmo que você esteja fazendo algo para ajudar o outro, se não for muito bem alinhado, desanda tudo - e dá até briga. Eu juro que é divertido!

Overcooked - Jogo desenvolvido pela Ghost Town Games e publicado pela Team17.

Brincadeiras à parte, o mesmo acontece em uma empresa onde o trabalho em equipe e a colaboração são fundamentais para gerar produtos de qualidade, porém onde as pessoas também necessitam minimamente de uma divisão de responsabilidades para conseguirem trabalhar em alta performance, confiar em si mesmas e em seus pares. Sempre que trabalhei em ambientes assim, hierarquizados ou não, isso refletiu positivamente nas entregas.

COMO?

Como definir esses papéis?

É claro que não existe uma fórmula, temos muitas referências que criam definições de papéis entre áreas - como Marty Cagan faz no livro Inspirado -, e outros extensos materiais sobre trilhas de carreira e liderança em design espalhados por aí, o interessante é consumir todo esse conteúdo e criar um modelo que funcione para a sua empresa. Diante desse mar de possibilidades, aqui vão as minhas sugestões sobre como começar a fazer isso para cada plano.

Entre especializações

Havendo um time de UX Research, cabe a um designer generalista realizar uma pesquisa? E com um time de UX Writing, até que ponto os outros designers fazem entregas textuais? Se UI está contido em UX, as tarefas de um excluem as do outro? Qual é o escopo de trabalho do designer de produto afinal?

  1. Defina a estrutura do time: dependendo da quantidade de designers, cultura, entre outros fatores, adote um modelo generalista, especialista ou híbrido.
  2. Descreva as atribuições de cada posição ou grupo: times híbridos são os que mais precisam de clareza de papéis, evite sobreposições ao fazê-lo.

Entre níveis de experiência

O que é esperado de um designer pleno? E o que fazer para virar sênior? Qual a diferença entre os entregáveis de liderança e os de contribuição individual? O quanto de "mão na massa" deve ter cada perfil? Quais são as responsabilidades de um gerente? E de um principal?

  1. Monte um plano de carreira: considere trilhas técnicas e de gestão mirando no contexto da empresa, mas sem deixar de buscar consistência entre companhias do mercado.
  2. Declare papéis e missões: cada trilha e cada nível merecem visibilidade sobre o presente e o futuro dos indivíduos, especialmente na migração para gerência - como mostra esse artigo.

Entre áreas

Quem é responsável pela etapa de Discovery? Quem define o problema a ser atacado? Quem tem a palavra final sobre a experiência do usuário? E sobre a estratégia do produto? Quem define o MVP? Até onde as limitações técnicas determinam o produto final?

  1. Declare papéis e missões: interseções são normais entre produto, design e tecnologia, cabe entender e delimitar os poderes de decisão para cada área de competência.
  2. Monte uma matriz RACI: é opcional ser mais granular ainda e usar esse modelo, onde cada etapa do ciclo de produto é contemplada com as atribuições de cada papel.
  3. Crie fluxos de trabalho: defina processos e rituais que espelhem como essas verticais interagem em cada momento.
Matriz RACI - Exemplo que executei recentemente.

Bônus

Será que essas delimitações reduzem o impacto do designer e diminuem a colaboração entre os times?

Não, pelo contrário...

  1. Mantenha a comunicação forte: mesmo incluindo as outras áreas no processo, o designer fica mais empoderado para tomar as decisões que cabem a ele.
  2. Não deixe designers isolados: definir papéis não significa segregar, leia esse texto obrigatório e entenda porque o modelo de squads não funcionou - nem pro Spotify. Designers descentralizados perdem voz e têm dificuldade de manter a consistência entre produtos.
  3. Crie um processo focado em design: junte os designers em um time ou em tribos, e use uma metodologia ágil para organizar suas demandas em conjunto, mesmo que cada designer ainda fique responsável por um produto ou squad específico.

Design é inclusivo, não se faz sozinho.

O QUÊ?

O que ganhamos de fato com essas definições?

Na minha experiência, os resultados positivos das iniciativas sugeridas acima foram nítidos sempre que aplicados. Reuni alguns deles aqui a partir de feedbacks tanto de líderes de outras áreas como dos próprios designers:

  • Auto-confiança e performance: com expectativas alinhadas sobre como e até que ponto atuar no dia-a-dia, as pessoas ficam mais produtivas e confiantes com seus entregáveis.
  • Trocas eficientes: discussões colaborativas sobre o futuro do produto são mais amigáveis e práticas quando cada parte está ciente da responsabilidade que cabe a si.
  • Alinhamento e comunicação: rituais bem estruturados entre pares e entre designers garantem uma colaboração com menos ruídos.
  • Sentimento de equipe: entregas feitas por um time de designers, não individualmente, geram confiança mútua para dentro e para fora do grupo.
  • Mais organização e previsibilidade do esforço de design: processos ágeis focados em times de design reduzem demandas fora de escopo e as tarefas estimadas diminuem a sobrecarga.
  • Consistência entre produtos: designers empoderados e trocando com frequência entre si conseguem construir produtos mais robustos e consistentes.
  • Autonomia na medida certa: ter ownership do que cabe a si durante a construção do produto garante sentimento de autonomia sem desviar o foco do objetivo principal em comum.
  • Qualidade das entregas: todos os itens acima corroboram com mais cuidado e carinho com os produtos, que possuem responsáveis claros e acionáveis.
  • Cultura de design: cultura se faz de dentro para fora, é mais fácil ampliar a cultura de design dentro uma empresa quando os designers estão mais unidos e cientes do seu papel.

Separe um tempinho para fazer isso pelo seu time, principalmente se você for um líder, mas não seguindo nenhum tipo de framework, e sim entendendo em conjunto como pode funcionar dentro da organização. Reforçando que, assim como qualquer processo, essas definições não devem ser engessadas, elas evoluem - tão rápido quanto - com a companhia, então mantenha a linha de pensamento em melhoria contínua, e adapte sempre que necessário.

Ao infinito, e além!
Bianca Galvão

Sou graduada em Desenho Industrial pela UFRJ, pós-graduada em Design de Interfaces pela PUC-Rio, além especializações em desenvolvimento web e métricas de UX. Tenho mais de 10 anos de atuação somente no mercado de produtos digitais para grandes marcas como: Mr. Cat, FIFA, B2W, Rock in Rio, Ingresso.com e VTEX. Minha missão como liderança na área de design de produto é remover obstáculos e criar meios para que os designers trabalhem em alta performance, construindo experiências mais humanas, consistentes e apaixonantes.

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