Falar sobre o redesenho das jornadas de aprendizagem das escolas de ensino superior é muito mais do que discutir sobre metodologias de ensino ou plataformas digitais de videoconferência.
Este é um debate muito mais amplo e complexo, que deve envolver pais, alunos, professores, gestores escolares, investidores, além de representantes da comunidade, órgãos reguladores e agentes políticos. Em outras palavras: é um desafio para todos nós!
Em 2022 vejo que o Learning Experience Design (LXD) poderá ajudar as Instituições de Ensino Superior (IES) a remodelar suas jornadas de aprendizagem, tornando-as mais focadas no ser humano.
O modelo de ensino desenvolvido na Europa, no final do século 11, foi de extrema importância para a preservação do conhecimento, desenvolvimento da ciência e também das escolas de negócios, hoje Instituições de Ensino Superior (IES).
No Brasil, foi somente no final do século 19 que surgiram as primeiras iniciativas de educação para o trabalho e a criação de escolas técnicas. Foi neste cenário, pós-revolução industrial, que surgiu o modelo que ainda perdura em muitas das nossas escolas até hoje.
Tal modelo, forjado no Brasil há pouco mais de 100 anos, apresenta uma jornada serializada, na qual o aluno passa por um conjunto de etapas, como em uma linha de montagem, até que conclua o percurso com ao menos 60% de todo o conhecimento necessário para inserir-se no mercado de trabalho.
Em 2020, as escolas de todos os estados do Brasil se viram forçadas a repensar o seu modelo de aula. Foi um ano de dúvidas, incertezas e também de espera que as aulas voltassem presenciais, o que não se concretizou.
Em 2021, pude perceber na minha experiência como professor e coordenador de curso, um movimento mais ativo das IES e dos professores em relação ao “novo normal”. Investimentos em infraestrutura, além de adequações dos planos de aulas, melhorias na dinâmica das aulas remotas. Alguns começaram a questionar: como será quando as aulas presenciais voltarem?
E elas voltaram, porém com os professores transmitindo de dentro de salas vazias ou com a grande maioria dos alunos assistindo às aulas do outro lado da tela (em casa, no celular, no trânsito, no trabalho, dentre outros).
A pandemia nos deixou mais conscientes do problema da educação, porém há outros desafios que precisam ser levados em consideração. E que vão além da sala de aula.
Hoje há um descompasso entre o conteúdo que os profissionais aprendem em sala de aula e as competências almejadas pelas empresas. Os alunos estão se formando para o passado, muito por causa da lentidão na adequação dos currículos escolares e de como as escolas são avaliadas pelos os órgãos reguladores. Como exemplo a prova do ENADE, que avalia temas que já não são relevantes ou até mesmo obsoletos.
Em consequência, algumas empresas já não exigem o diploma de graduação em seus processos seletivos, principalmente na área de tecnologia da informação. Vale muito mais o conhecimento prático do profissional do que um certificado desatualizado. Em outras palavras, se o diploma era o grande prêmio ao final do curso, esse pode começar a perder o seu valor.
Há ainda as empresas que buscam formar o profissional de maneira interna. Criando cursos e treinamentos corporativos que visam moldar o empregado à realidade da companhia.
Se, por um bom tempo, seriam as escolas as grandes detentoras do conhecimento, como citado anteriormente, hoje vivemos uma abundância de conteúdos sendo produzidos e compartilhados na World Wide Web. Há diversos autores de renome que divulgam seus trabalhos e também várias instituições de ensino que compartilham seus cursos de forma gratuita na Internet.
A concorrência não é mais localizada no seu bairro ou cidade. Ela está nas “nuvens”.
Há também as plataformas online de ensino que oferecem cursos isolados com conteúdos atualizados e a preços acessíveis, otimizando o acesso ao conhecimento e sua aplicabilidade. Além das curtas formações (nanodegree) que ofertam em cerca de 6 meses a preparação do estudante para habilidades bem valorizadas pelo mercado.
Com a evolução da Internet e dos recursos tecnológicos computacionais, o planeta vive um processo de transformação digital que coloca em xeque os modelos de negócios de diversas empresas e de múltiplos setores, inclusive a Educação.
Em um artigo publicado pela a Microsoft (2017), foi citado que “de acordo com a Harvard Business Review, 84% dos CEOs de hoje acreditam que a ruptura digital é iminente e quase metade acha que seu modelo de negócios estará obsoleto em 2020”.
No caso da educação, o professor extraordinário do Centro de Estudos e Sistemas Avançados do Recife (CESAR) e também autor Silvio Meira alerta em sua aula magna de 2021 que a educação se tornou mais Figital (Físico + Digital + Social) e é preciso três grandes rupturas para que ela se transforme de fato:
Se você chegou até aqui, deve estar se perguntando: o que tudo isso tem haver com design? Os gestores escolares não sabem por onde começar e é preciso um olhar criativo para recombinar todos estes elementos.
Por onde começar, então? Esta é uma pergunta muito ampla e vou me restringir, por ora, apenas aos processos educacionais.
1 - Creio que primeiro devemos partir do princípio do Design Centrado no Estudante. Colocar o estudante no centro do seu projeto, buscando entender o seu dia a dia, suas limitações e desejos. Contudo, não esqueça do professor!
2 - Busque identificar situações-problema, dentro e fora da sala de aula, e convide professores e estudantes para co-criarem e validarem as suas soluções.
3 - Defina bem as personas da IES. Conheça suas diferenças e semelhanças.
4 - Tenha em mente os objetivos estratégicos da escola.
5 - Não deixe de visitar as empresas de mercado e entender suas demandas. Os setores de estágio também podem dar boas indicações.
6 - Mapeie (User Story Mapping) os diversos contextos que podem fazer parte da jornada de aprendizado do estudante.
7 - Busque saber sobre as melhores formas de ensinar, aprender e estudar.
8 - Leve em consideração o ambiente de estudo
9 - Considere os aspectos ergonômicos do estudante: sentidos, limitações físicas, tempo de descanso, tempo livre de estudo, entre outros.
Por fim, convido à leitura de alguns temas bem relevantes no momento: Educação 5.0, Transformação Digital, Neurociências, Tecnologias Emergentes e Agilidade.
No mais, que venha 2022! Que possamos ajudar a redesenhar a Educação. Criar salas de aulas mais engajadoras. E, sobretudo, que possamos contribuir para a formação de seres humanos autônomos e uma sociedade melhor.
Daniel Lopes é designer de interação e professor com mais de 15 anos de trabalho com desenvolvimento de produtos digitais, lecionando, além de ter atuado como dev-frontend. Nos últimos anos tem redirecionado seus trabalhos para a área de educação, além de ser um evangelizador dos métodos ágeis