Design 2022
Jeane Bispo
UX Writer no PicPay
Mulher preta, aprendiz, curiosa, determinada

UX Writing: a construção do texto e a variação linguística do Brasil

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O jota é ji, o éle é lê
O ésse é si, mas o érre
Tem nome de rê
-
Luiz Gonzaga

No último ano, o número de vagas para a área de Experiência do Usuário (UX, User Experience) cresceu, assim como as contratações de profissionais de diversos estados do Brasil. Essa diversidade regional dos profissionais de UX pode favorecer a um dos objetivos da nossa profissão: criar soluções que incluam.

Nesse cenário, acompanhamos também o crescimento do número de vagas para a função de UX Writer. Isso pode evidenciar que o texto com foco na experiência do usuário tem ganhado espaço e que as pessoas e as empresas têm entendido a sua importância. Que bom! Pois, não podemos esquecer que para algumas pessoas o texto é a própria interface.

Aqui, quero falar do meu lugar de nordestina e que costuma questionar a forma como palavras e sotaques das regiões mais prestigiadas do país são colocados como universais. Como se fossem comuns para os 4 cantos do Brasil.

Costumo relacionar os conhecimentos da minha formação em Letras com as discussões que temos em UX Writing. Em um desses momentos, me questionei: será que estamos criando textos que consideram a diversidade linguística do nosso País?

Sabemos que UX Writing no Brasil é uma disciplina relativamente nova. Eu acredito que, para o seu amadurecimento, precisamos incluir nas nossas discussões o tema de diversidade linguística do Brasil. Quando falo dessa inclusão, não espero encontrar nos sites, apps e chatbots, palavras ou expressões, como: Oxente, Visse, Uai, Bah etc., mas, de pensarmos que, assim como esses termos podem nos causar certa estranheza, aqueles que são considerados universais também podem parecer assim do lado de cá.

Para tocar no assunto de diversidade linguística é importante falar também de onde ela surge: da variação linguística. Essa é definida como um fenômeno natural da língua e que reflete no modo de falar da população, seja pelo sotaque, vocabulário ou aspectos gramaticais.

A variação linguística pode ser dividida em 3 ou até mais categorias.

Algumas delas são:

  • Variação diastrática ou social: se relaciona com aspectos socioculturais, grau de escolaridade, profissão, idade etc. Ex.: jargões das profissões, vocabulário de jovens e idosos e outros.
  • Variação diatópica ou regional: palavras e sotaques de lugares diferentes. Essa variação pode ocorrer entre regiões do país e até mesmo entre cidades do mesmo Estado. Tangerina ou mexerica? Biscoito ou bolacha? Sotaque do Rio Grande do Sul e o sotaque da Paraíba são alguns exemplos dessa variação.

Vale destacar que não existe certo ou errado quando falamos de variação linguística, entender isso já evita a prática de preconceito linguístico.

De forma geral, a bolha onde vivemos costuma ter pessoas que possuem a mesma classe social,  frequentam os mesmos lugares, possuem a mesma idade que nós, gostam das mesmas coisas ou simplesmente vivem na mesma cidade ou região.

A consequência disso é que podemos cair na cilada de acreditar que todas as pessoas entendem e fazem parte do mesmo contexto que nós. É que, às vezes, achamos que somos universais.

Uma das ferramentas que usamos em UX para tentar estourar a nossa bolha é a pesquisa com as pessoas usuárias. Criamos roteiro, recrutamos, entrevistamos e acreditamos ter embasamento para escolher X em vez de Y.

E temos esse embasamento! Mas até onde ele está sendo diverso e inclusivo como, em teoria, nossa solução deveria ser?

Se já sabemos a importância de entender o que faz e o que não faz sentido pros usuários, por que o recrutamento de pessoas para as pesquisas e testes, muitas vezes, se resume a perfis muito similares? 

Nós, UX Writers, discutimos e defendemos a importância do uso de uma linguagem simples, acessível etc. Mas nada disso será alcançado se tivermos como régua apenas a nossa própria experiência ou a experiência daqueles que estão na mesma bolha que nós.

Alguns exemplos que podem (ou não) fazer sentido pra você:

"Ideias verdes incolores dormem furiosamente", Noam Chomsky

Quando não consideramos a variação social, podemos entrevistar apenas pessoas graduadas ou com Ensino Médio completo, e aquelas que estão fora desses grupos podem não conseguir preencher o cadastro, por exemplo, porque a frase gramaticalmente correta que você escreveu, não faz nenhum sentido para elas. 

Esse foi o objetivo do Noam Chomsky quando criou a frase acima: mostrar que não é porque atende a alguns critérios gramaticais que o texto faz sentido.

"Batatinha frita 1, 2,3", Série Round 6 

Se entrevistarmos apenas pessoas de 20-40 anos, não teremos como constatar se aquela palavra ou frase que virou meme vai fazer sentido para as pessoas de 60 anos ou mais. Aliás, essa frase pode não fazer sentido até mesmo para as pessoas mais jovens, mas que não assistiram à série.

Assim como “Batatinha frita 1, 2, 3…” foi usada  por muitas empresas para aproveitar o sucesso da série, será que temos usado palavras ou frases que fazem sentido apenas para um grupo muito específico? 

"Tire foto do seu holerite"

Holerite, também conhecido como recibo de vencimento, contracheque, demonstrativo de pagamento

Quando tratamos as palavras usadas por determinada região como se elas fossem comuns, caímos na cilada de as pessoas precisarem pesquisar o que ela significa. Será que as palavras usadas na sua região fazem sentido pra quem está do outro lado do país? Será que podemos, pelo menos, explicar o significado do termo que estamos usando?

Esses são alguns exemplos do porquê pensar na diversidade/variação linguística.

Com o que apresento aqui, não estou sugerindo a adoção de palavras e expressões de determinadas regiões, classe social ou faixa etária, mas a reflexão se os textos que construímos fazem parte do campo semântico de um único grupo ou se temos pensado na variação linguística do Brasil.

Para conhecer mais sobre essa variação, devemos fazer testes para imergir no vocabulário dos usuários, por exemplo: teste cloze, teste de percepção do conteúdo, marca texto e até mesmo estar atenta ao que é dito durante os testes de usabilidade, entrevistas em profundidade etc.

Somente conhecendo o universo semântico das pessoas usuárias, estejam elas onde for, é que conseguiremos realmente transformar o texto no "fio condutor da jornada do usuário".

UX bebe da fonte de diversas áreas de conhecimento: antropologia, psicologia, design etc. e, no caso de UX Writing, também da linguística. É com base nela que devemos tentar entender aspectos relacionados à língua e, a partir disso, construir textos que permitam o entendimento de pessoas que vivem nas mais diversas regiões, estados e cidadezinhas.

Se conseguirmos colocar isso em prática, estaremos de fato criando uma escrita com foco na experiência do usuário brasileiro.

Jeane Bispo

Jeane Bispo, filha de Dona Ana e de Seu João. Natural de Salvador, apaixonada pela Bahia, amante da natureza, aprendiz de um monte de coisa e continua… Acredita que simplificar é uma das formas de incluir e por isso se tornou uma profissional que simplifica textos para a Experiência do Usuário.

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